segunda-feira, fevereiro 13, 2006

A meus pais

Eis que sou de novo empurrado para uma outra nova vida que começa, como sempre, sem que tenha pedido. Arrancado do confortável ventre dos livros, não consigo mais que pensar nas saudades que tenho dos tempos em que, em absoluta paz, puxava repetidamente curioso os pelos dos braços do pai e das vezes que os olhos da mãe me viam adormecer aninhado em suas pernas em frente àquela lareira.
De vosso amor ergueu-se alguém que assentou as loucuras em fieis sanidades e aos tropeções foi encontrando livre os seus caminhos para fora dessa cidade e desse país mas nunca para fora de vós.
Sou hoje os mesmos olhos que viam o frágil olhar molhado que na mãe murchava sempre que me despedia, o mesmo riso que soltava quando o pai me beijava o pescoço em tenra idade, a mesma voz que tentava adivinhar pelos inebriantes cheiros a comida da mãe, o mesmo corpo que aconchegavam ambos noite após noite em meus lençóis, a mesma euforia das noites de Natal, o mesmo tonto que tantas vezes abriu a custo os sorrisos escondidos na barba do pai e outras tantas sem custo algum a irritação no semblante da mãe.
Poder-me-ão dizer que na verdade sou muito mais que estes pequenos “nadas” que guardarei num canto quente e acolhedor do meu peito até ao dia que este corpo pereça, e poderá haver até lastro nessa razão, mas sei que sempre que me encarar no espelho verei não somente o que fui e o que sou, mas o que foram e o que são pois afinal serei sempre… o vosso filho.