domingo, fevereiro 26, 2006

Suicídio de outro dia

Ali consumia o tempo à velocidade a que um whisky escapa de um copo, ainda hibernado de corpo e alma nesse deambular diurno a que a crescente inércia do passar dos dias impeliu. Em frente e do outro lado do conforto dessa tua racional solidão, como sempre, nada mais amanheceu em tuas palavras e gestos que a ténue aurora de uma talvez azeda esperança que sabias ser palpável para mim.
Abandonou-te extinta a luz trémula da lareira e o som daquelas cordas empurrou-nos ao encontro do peso das pálpebras e quiçá ao da mente. Saímos.
Entregando os passos a um chão que não os conhece, segui em linha recta enquanto me pagavas com o teu silêncio a ousadia de ter sido eu próprio outra vez. Passámos por aquele mesmo café, desta vez numa outra ponta da cidade, enquanto do lado de fora da oblíqua janela periclitavam, sobre braços de madeira despidos de folhas, pequenos troços do branco céu que cobre Madrid nocturno.
Desafiante, acendeste um dos teus cigarros com o pretexto de que era só mais um e assim, sem que te desses conta, se suicidou por ti o final de outro dia meu…

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Porque te auto-entitulas palhaço triste? Disfarças alguma tristeza fingindo-te feliz? Ou és apenas alguém que busca algo incessantemente mas não sabes bem o quê?

quinta-feira, 09 março, 2006  
Blogger Um_palhaço_triste said...

Palhaço triste porque muitas vezes, como na ópera de Ruggero Leoncavallo - "Pagliacci", somos empurrados para um palco onde não queremos estar para mostrar o que não se sente.
Sucede que estar triste significa pensar um pouco na vida, e pensar um pouco na vida significa PENSAR... e isso custa!
Daí que neste mundo de "prête-a-portez" e "prête-a-manger" acrescenta-se o "prête-a-penser" que não deixa espaço à tristeza!
Estar triste não é ser triste (se assim fosse seria Um_triste_palhaço), a tristeza liberta e abre portas a um novo "EU" em todos nós pois dela resulta amíude um novo caminho (pensado), já a falsa alegria química que se propagandeia como vida é obsidiante e castradora e resulta da falta de iniciativa de um cérebro adormecido pela força bruta do passar dos dias!

quinta-feira, 09 março, 2006  

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