quarta-feira, junho 28, 2006


Photo by: Diogo Franco

terça-feira, junho 27, 2006

Blasco de Garay

Voavas na aura do meu desejo e não sabia se fazer-te real era o que queria. Imaginava tímido a tua voz alta de espanhola de cada vez que julgava ver-te pelos passeios de Madrid e ali estavas… de novo sentada naquele mesmo café, que tal como eu já havíamos feito nosso. Três, quatro, cinco, seis metros separavam a tua beleza espectral do meu corpo magneticamente colado à cadeira e esta ao chão e o chão ao centro da terra. Senti o poder da massa física do planeta esmagando-me contra si, impedindo-me de me mover para ir ao teu encontro… senti-me enjoado como depois de uma longa viagem em autocarro e ao mesmo tempo a querer chorar a minha impotência perante tudo.
Ainda ignoravas a minha existência e mais ainda a minha presença, e os metros que nos dividiam eram anos-luz a meus olhos. De repente, pulsa o sangue nos membros e na cabeça, rompem-se as leis desta física e estou de pé… agora já não há volta atrás.
Refreado que está pelo temor da mente, caminha lento o meu corpo como se vestisse um antigo escafandro e me movesse dentro de água, e a cada passo parece que meu coração de tanto bater por ti explodirá quando esteja já a teu lado para que assim não te revele nada da minha alma. Vejo-te um pouco estranha perante a minha proximidade e ao olhares-me e sinto-me ridículo, tenho de matar este silêncio já ou matar-me-á ele a mim…
“- Hola!... Por favor dime solo una palabra que sea para que con tu voz salgas de una vez por todas de mi sueño y te haga real. Es que ya no puedo vivir sin saber si eres mirage u oásis."
Levantas-te decidida e num só gesto encostas suavemente os teus lábios húmidos aos meus, fecho os olhos e desapareces…

quarta-feira, junho 14, 2006

Loucura

Sentado na beira da minha cama, não sei se acordei já. Não abro os olhos, ainda é cedo para ver o que é real mas de repente algo me invade… de repente sou feliz! Não me quero mover, não quero pensar, não quero fazer nem um gesto. Não pode fugir. Quero que este cosmos, que sobre mim se derramou, em mim habite… só mais um pouco. De uma só vez e em uníssono sou os sorrisos que as faces de meus amigos me deram, os doces olhos que as mulheres que tive me emprestaram, o riso infantil de meu primo Tomás quando lhe faço cócegas, a calma das tardes de Verão na companhia de meus pais, o aconchego do frio beirão na lenta combustão do carvalho na lareira, a leveza da luz de Lisboa ao pôr-do-sol, a decisão das vozes que fremem altas em Madrid e sempre me contagiam… em tudo isto fui e sou e tudo isto é agora em mim…
E penso: “seria demasiado ficar neste mesmo lugar, assim, para sempre nesse vício de egoísmo puro que deixa o mundo correr fútil e vago lá fora?! Entregar-me à loucura de permanecer feliz até perecer na fome?!...” e neste mesmo pensamento se exaure de essência este momento que ainda que fugaz sei que foi meu.
Afasta-se rápida essa tal de “loucura” momentânea. Ponho o peso nos pés contra o chão e sinto-me desperto, e ainda que não acordado cumpro agora a velha rotina. Primeiro a camisa branca como o pensamento da manhã, depois a gravata encarnada como o sangue que a trote pulsa em minhas veias, o fato escuro que ponho mas não visto, os sapatos negros que calço mas não uso e assim tapei do mundo o homem que acordou feliz…
Paro em frente ao espelho, olho o que resta de mim e afinal não sei se, ao invés, não será isto a loucura!

terça-feira, junho 06, 2006


Photo by: Diogo Franco

sábado, junho 03, 2006

A espera

Naufragam teus olhos em coisa nenhuma
Densos que estão das âncoras no ontem
Pois nas ruínas dos portos de teu peito
Já não atracam as palavras que esperas
Porque ainda esperas…
Fustigam as ondas negras da noite em ti
A carne que nesse teu corpo se fez pequena
Por já quase não ter alma para conter
De tanto se esvair em sal e água
E ainda esperas…
Agora até a suave maresia corta a tua fina pele
Com os pregos desse barco que à deriva implodiu
Mas na dor não parecem ser maiores a essa farpa
Que cravada apodreceu à esquerda de teu peito
Mas ainda esperas…